Experimentos Pedagógicos

Colégio Francisco Mendes
(2019-2023)
2019
Ao entrar no Colégio Francisco Mendes, em Serra Talhada - PE, em 2019, como supervisor pedagógico, eu vinha recém saído do mestrado e da ocupação estudantil da qual participei na UFCG (campus Sumé - PB).
Foi um grande choque ter saído de ambientes, que com todos os seus problemas, eram altamente questionadores, para me deparar com uma escola de cultura bastante tradicional e hierárquica como a do CFM.
No primeiro ano, apenas acompanhei e auxiliei a coordenação e a direção nas tarefas do dia a dia, principalmente nas formações de professores. No entanto, nesse momento já buscava trazer referências com as quais me deparava fora dali, como José Pacheco e Lauro de Oliveira Lima. Trazia filmes, vídeos de palestras no youtube e trechos de livros para discussão com os professores. Era bem desgastante pois não havia a cultura do estudo e o espaço de formação era usado apenas para bate-papos informais, resultado: me tornei o chato que queria trazer mais trabalho para quem já estava exausto.
Naquele momento, eu sentia que algo estava faltando na minha abordagem, eu não queria apresentar uma proposta pronta, até porque não sabia por onde ir. Mas ao tentar criticar o sistema vigente, também tornava tudo mais confuso: "Mas se não é assim, qual seria a saída?", "Como fazer diferente?". Estas são perguntas que inevitavelmente aparecem em qualquer formação de professores.
Confesso que nesse primeiro momento, eu não tinha a mínima ideia das possíveis respostas - e hoje ainda não tenho nada definitivo - estava preso a uma visão moralista, separava o mundo entre quem se comprometia com a mudança e quem estava acomodado ao sistema.
2020
No ano seguinte, com a saída da diretora pedagógica, acabei assumindo como diretor, ainda que com alguma desconfiança das donas. O ano começou de maneira habitual: formação comandada pela editora parceira da escola e encontros de formação interna, com a psicóloga e comigo.
Comecei a perceber como de fato as coisas funcionavam, mas ao mesmo tempo não queria fazer mudanças radicais sem realmente perceber como as as relações funcionavam desse novo ponto de vista, como as pessoas se comportavam nos encontros, no dia a dia, mas também quem estava comprometido e quem não estava.
Mas aí, de repente, veio a pandemia e tudo mudou.
Em uma semana tivemos que passar toda a estrutura da escola para o plano virtual: criamos salas no Google Classroom, aprendemos a usar o Google Meet, criamos Drives para acompanhamento das turmas.
Neste momento, me veio também um estalo: é agora que podemos mudar, não haverá outra oportunidade como essa. E mudamos, dividimos as turmas entre os professores: cada turma teria dois tutores no fundamental 2 e no fundamental 1 os tutores seriam os professores de turma. Já a organização a aprendizagem e do cotidiano ficaria assim: os alunos fariam roteiros de estudo, que nada mais são que sequências de atividades (a partir dos livros) organizadas de modo linear. Assim, os estudantes teriam a cada duas semanas 3 roteiros para fazer, eles escolheriam a sequência e a cada dia se reuniriam com seus tutores para discutir o andamento dos roteiros nos 3 primeiros horários. Após o intervalo, eles teriam mais 2 horários com as aulas, geralmente deixavamos a maior parte deste tempo para as aulas de matemática e português, mas também foram incluídas as outras disciplinas. A ideia era reduzir ao máximo as aulas expositivas e tornar estes momentos o mais interativo possíveis.
Em muitos momentos o sistema funcionou, em outros nem tanto. Tivemos problemas principalmente com os estudantes mais velhos, que não abriam a câmera, não interagiam ou praticamente não falavam com os tutores. Havia também, nestes casos, uma certa dificuldade dos tutores em construir um vínculo com as crianças - não podemos esquecer que durante as aulas tradicionais, presenciais, o professor passava a quase totalidade do tempo falando e explicando. Esta nova função exigia um tipo de relação que muitos professores não estavam acostumados a exercer, exigia sobretudo um modo de se relacionar muito mais aberto, acolhedor e empático. Sem esquecer que estávamos em meio a uma pandemia traumática onde o receio de ser contaminado ou perder alguém, além do distanciamento social, que nos atingiu a todos de maneira inesquecível e definitiva. A saúde mental de todos nós estava comprometida, tivemos muitos problemas.